Quando falamos em Reconstrução articular, a palavra que vêm imediatamente a cabeça é prótese. A colocação de uma prótese, salvo excessão, de uma maneira geral é voltada para a população acima dos 50 anos e com artrose avançada na articulação do joelho, seja Uni, Bi ou Tricompartimental. Provavelmente você nunca ouviu falar nesse tipo de cirurgia e o TRANSPLANTE DE MENISCO é um tema que ganha cada vez mais força no mundo inteiro, com resultados estimuladores e voltado para a população mais jovem, que após sofrer grave lesão no menisco teve que ser submetido a Meniscectomia (retirada parcial, subtotal ou total do menisco).
Tentando explicar de uma maneira mais simples e abrangente, os meniscos são considerados as estruturas mais nobres do joelho, são fibrocartilagens (grosseiramente seriam como as nossas orelhas) e com função primordial e insubstituível de atuar na absorção do impacto, proteção da cartilagem e distribuição da carga que o joelho é submetido de forma constante durante a prática esportiva e nas atividades cotidianas, além de auxiliar na estabilidade e nutrição articular.
O risco de desenvolver artrose depois da meniscectomia tem sido demonstrado em muitos estudos clínicos e um conceituado Cirurgião americano, Noyes F, em 1994 já havia definido que “A perda do menisco é considerada a causa número 1 da saída de um atleta de alto-rendimento do esporte!”
Smith A, em 1972: Garantiu que “os meniscos suportam forças de reação 2 a 5 vezes maior que o peso corporal em atividades normais e até 24 vezes durante atividades de impacto”.
Outros autores conhecidos como Woo S e Arnoczky S, também em 1972 publicaram que os “Meniscos absorvem 50% da carga em extensão e 85% em flexão”.
Ainda falando da importância dos meniscos e suas funções biomecânicas, em 1972, Kettelkamp DB e Jacobs AW se aprofundaram no assunto e comprovaram que o Menisco Medial (MM) transmite carca de 45 a 50% da carga que transpassa o joelho enquanto o Menisco Lateral (ML), ainda mais importante, é responsável por 65 a 75%. Definiu também que a Ressecção do MM reduz em 50 a 70% a superfície de contato e aumenta o estresse na superfície articular em 100%; já a ressecção do ML reduz em 45 a 50% superfície de contato e aumenta o estresse na superfície articular em 200 a 300%!! Neste mesmo estudo, 53% dos pacientes já apresentavam queixas referentes a perda do menisco após 4 anos da cirurgia e 67% após 14 anos.
Então, qual seria a melhor opção para preservação dos meniscos lesionados?
Comprovada no mundo inteiro como a melhor opção no tratamento das lesões de menisco (quando possível) a sutura de menisco (Meniscorrafia) tem o poder de “salvar”, de mudar a história natural do joelho, atuando não apenas no tratamento da referida lesão como também na prevenção de uma artrose futura.
É como se a Meniscectomia tratasse o problema de forma imediata e temporária, porém criando um novo para o futuro do joelho, a artrose.
Difícil de imaginar, uma vez que 99% dos Cirurgiões, especialistas em Cirurgia do Joelho no Brasil não realizam a técnica da Sutura de Menisco.
Dentre outros, os principais motivos que os cirurgiões costumam alegar são a dificuldade da técnica (é considerada uma das cirurgias mais difíceis dentre as técnicas que envolvem joelho), o tempo de cirurgia (visto que ressecar uma lesão é infinitamente mais rápido do que suturar o menisco) e, pasmem, o critério financeiro (“os planos de saúde não remuneram o cirurgião pela técnica, sendo os valores para meniscectomia e meniscorrafia bastante similares”).
Em teoria, quanto mais pacientes fizerem artroscopia e tiverem o menisco ressecado através da meniscectomia, em tese, mais pacientes entrariam na “fila” como candidatos em potencial a realização do Transplante de Menisco.
Considerada “a técnica mais difícil dentre todas na especialidade da Cirurgia de Joelho”, o Transplante de Menisco consiste na Reconstrução da anatomia articular através da colocação de um menisco proveniente de um Banco de Tecidos. Os tecidos são preparados e testados, sendo o risco de infecção, rejeição ou transmissão de doenças inferior a 1 caso / 1 milhão (similar ao paciente que recebe uma transfusão sanguínea).
Esse procedimento complexo já vem sendo realizado ao redor do mundo a cerca de 30 anos com resultados estimuadores quando bem indicados e realizados, porém com poucos casos no Brasil até o momento.
Quem seria o Candidato ideal ao Transplante de Menisco?
Pacientes jovens (até 50 anos), que apresentam dor na interlinha articular secundária a defiência meniscal ou sinovite intermitente no joelho e com evidência documentada de meniscectomia subtotal ou total prévia. Deve apresentar estabilidade articular (ou fará a reconstrução ligamentar simultânea), nenhuma evidência radiográfica de artrose avançada no joelho e sem deformidade angular no membro inferior (valgo ou varo que podem ser corrigidos por osteotomias 6 meses antes do Transplante) e com alteraçãoes precoces até grau I ou grau II da cartilagem articular por sobrecarga e sem apresentar incongruência articular durante a artroscopia. A decisão final é feita intra-operatória e as lesões condrais (cartilagem) grau III ou grau IV contra-indicam o procedimento.
Como é feito o planejamento e preparo pré-operatório?
– Clínica: controle do peso corporal em relação a altura; avaliação da estabilidade articular (LCA, LCP, LCM, LCL e CPL), avaliação da marcha e agachamento, avaliação do eixo do referido membro inferior;
– Radiológico: Rx panorâmico de Membros Inferiores (avaliar os Eixos Mecânico e Anatômico); Rx em AP com carga monopodal em extensão, Rx em PA com flexão de 45˚, Axial de patela e perfil;
– Ressonância Magnética Nuclear (RMN) para avaliar a qualidade e quantidade do tecido meniscal restante e demais estruturas do joelho;
– Cintilografia óssea em casos de dor inespecífica;
– Tomografia Computadorizada (TC) pode auxiliar na mensuração do tamanho do platô tibial e consequentemente do menisco;
– Mensuração do tamanho do menisco a ser utilizado com protocolo definido com o Banco de Tecidos (RX, TC e RMN).
– Exames pré-operatórios básicos incluindo sangue, urina, Rx tórax, eletrocardiograma e avaliação do Risco Cirúrgico realizada por cardiologis ou clínico geral de confiança.
É necessário fazer algum tipo de teste para compatibilidade do tecido ou antibioticoterapia específica?
Não. O tecido é preparado, testado e armazenado congelado nos Bancos de Tecidos que são locais específicos para essa função. Como dito anteriormente, o risco de infecção, rejeição ou transmissão de doenças é inferior a 1 caso / 1 milhão (similar ao paciente que recebe uma transfusão sanguínea. A antibioticoterapia é feita durante a cirurgia, como em qualquer outro tipo de cirurgia ortopédica e não no período pós-operatório.
Qual o melhor momento para realização do Transplante?
Acreditamos que a linha entre fazer a cirurgia e passar o time correto é muito tênue. A sinovite (inchaço) do joelho após atividades básicas é considerada o melhor momento para se iniciar a programação para o Transplante.
O Transplante de Menisco foi feito para a prática esportiva?
Não para atividades profissionais. Atividades que envolvem muitos movimentos de giro e trocas de direção (movimentos do tipo pivô), como Futebol, Basquete e Rugby devem ser desencorajadas pelo risco da lesão no menisco transplantado. Outras atividades como Ciclismo, Corridas, Caminhadas, Musculação, Tênis, Surfe, StandUp, Esqui entre outras, são autorizadas de forma irrestrita após 6 a 8 meses do procedimento, quando o paciente recebe alta completa.
Em que condições o Transplante está Contra-indicado?
As contra-indicações incluem pacientes com artrose avançada, Idade superior a 50 anos, Mau alinhamento axial, Instabilidade da articulação, Artrofibrose (rigidez articular), Atrofia muscular severa, Infecção articular prévia e Pacientes assintomáticos.
De que consiste a técnica cirúrgica do Transplante de Menisco?
O menisco previamente mensurado e selecionado para o Transplante é inserido no joelho através de 2 pequenos acessos cirúrgicos, junto com um pequeno bloco ósseo. A cirurgia é toda feita com a colocação de uma câmera filmadora no interior do joelho (Artroscopia). Após fixação do bloco ósseo, o menisco é suturado em toda sua extensão junto a cápsula articular, garantindo estabilidade ao menisco e retorno das funções de absorção do impacto e rolagem da cartilagem sobre ele. Portanto, o Transplante de menisco nada mais é do que uma grande sutura de menisco!
Como funciona o Pós-operatório da Cirurgia de Transplante Meniscal?
O paciente permanece internado por um total de 24 horas, consegue deambular com auxílio de 2 muletas e com carga parcial axial já no primeiro dia de pós-operatório. Utilizamos inicialmente um imobilizador de joelho como proteção (por 3 semanas), que é removido diariamente para a realização dos exercícios e da fisioterapia. A Crioterapia (Gelo) e os exercícios de fortalecimento também se iniciam no primeiro dia de pós-operatório e evoluem de forma progressiva. Após 6 semanas a carga sem muletas é estimulada. Com 3 meses de pós-operatório se iniciam os exercícios com bicicleta estacionária, com 5 meses as corridas. Após seis a oito meses o paciente é autorizado a retornar as atividades esportivas conforme explicado acima.
Qual a taxa de sucesso da Técnica de Transplante de Menisco?
Apesar da complexidade da técnica, os resultados da literatura mundial reportam sucesso em torno de 80% dos casos, com melhora da dor, redução da sinovite de repetição e possivelmente da evolução da artrose (não se sabe ao certo qual seria a evolução individual da artrose no paciente se ele não tivesse realizado o Transplante). As taxas de satisfação do paciente giram em torno de 90%.
Conclusão:
Estimulamos os pacientes a buscar mais informações com um especialista em Cirurgia de Joelho e principalmente em Reconstrução articular, Lesões complexas do joelho e acostumado com a técnica de sutura do menisco. Com certeza esse profissional terá a melhor resposta para as suas perguntas. Pense no melhor tratamento para o seu joelho, pense no que há de mais modermo, pense e acredite no Transplante.
Por Rodrigo Goes.